quinta-feira, janeiro 31, 2008

Há saída para o existencialismo?

Foi o que o Jorge perguntou. Não perguntou, de fato. Pensou consigo e, como alguém que “pensa alto”, comentou no indigitável.

Ora, será que é comigo? – acordou rapidamente meu eu-sabichão.

Após dois segundos de petulância incontida, passei eu mesma a percorrer as estradas que encaminharam o homem ao sentimento existencialista, e, por sentido oposto, remetê-lo-iriam à saída.

De onde viemos? E para onde vamos?

Ocidente e Oriente já tiveram suas respostas engatilhadas para essas questões. Nem sempre essas respostas eram homogêneas dentro dos respectivos hemisférios, mas estavam lá. Prontas para serem disparadas.

No Ocidente, porém, após um período de instabilidade política, reuniu-se o contingente sob o telhado de uma doutrina religiosa e universalista que não admitia diversidade nem contradições na sua interpretação da vida. E o fatalismo aconchegado nesse modo de pensar impediu, por muito tempo, que se lançassem dúvidas sobre o assunto.

Mas a natureza do homem, que sempre o leva à questionar as leis que lhe regem, acabou por atravessar os véus do poder despótico e, ao romper essa opressão, sentiu a bofetada das questões existencialistas lhe acertarem pesadamente a cara.

Uma torrente de cientificismo correu o mundo em busca de esclarecimentos, mas na medida em que elucidava as questões de ordem natural, mergulhava cada vez mais o homem em abstrações e perplexidade diante do inexplicável que, então, apresentou-se em proporções incomensuráveis.

De modo sucinto, o sentimento existencialista pode ser descrito como o efeito emocional desencadeado por toda a variedade de incertezas que envenenam a existência humana. Foi Sartre quem, pela primeira vez, usou o termo para se referir ao fluxo filosófico do qual ele mesmo acabou sendo o maior di-vulgarizador.

Não se engane, o existencialismo não é um sentimento exclusivo dos a-teístas. O próprio Sartre era cristão seguro!

O existencialismo se manisfesta quando a crença de um indivíduo ou de uma sociedade vacila. A saída tanto pode ser libertar-se das crenças como agarrar-se à elas sem contestar.

Mas, quantos homens são realmente capazes de fazer uma coisa ou outra sem fraquejar? E que sociedade estaria em pleno acordo para um tal feito por livre decisão?

A dúvida existêncial parece ser a verdadeira alma do homem. Não há saída em vida.

O existencialismo, como escola do pensamento, não surgiu para os teístas afirmarem uma verdade absoluta. Nem para os a-teísta contestarem ela. Ele está entre ambos para lembrá-los que não há respostas para todas as perguntas. É o sentimento comum que une a humanidade. Explorá-lo é expor, talvez para que perdoemos uns aos outros, aquilo de que todos sofremos: ignorância.

3 comentários:

JP Charleaux disse...

Lisa,

O Existencialismo, tal como eu o leio, não chega a tocar em questões tão inquietantes quanto os por quês da existência humana.

O tal Existencialismo, enquanto Humanismo, joga luz muito mais sobre as escolhas humanas que, por sua vez, forjam o que somos. Daí a conclusão de que ao homem não lhe é permitido não fazer escolha alguma, uma vez que a própria inércia é, em si, um ato, um ato de abstenção perante a existência. Sartre fala, então, de um empreendedorismo existencial (desafiador, questionador, filosófico, realizador, destemido, ocidental, não contemplativo, participativo e engajado), enquanto, de outro lado, estaria a náusea (vacilo, inércia, desistência, perplexidade, inação).

O problema todo é que esta concepção de Existência, do meu ponto de vista, pelo menos, é muito baseada em uma compreensão capitalista; como se o homem pudesse ser definido apenas pelos seus atos, acúmulos, realizações, idéias expressas, lutas lutadas.

Não quero recorrer a nenhum esoterismo barato, mas sabe-se que a contemplação e a meditação, a abstenção frente a certos fenômenos podem ser também formas complexas de existência (não vegetativa, é claro), em contraposição ao conceito de que existir é engajar-se e realizar.

Passados os anos 60 e 70 e revisitando algumas de suas teses, concluo, na universidade privada da minha cabeça, que nem só de ação vive a Existência. Há mais dimensões envolvidas na Existência. As principais delas estão relacionadas a lógicas que não lhe correspondem enquanto Ciência Humana. É dizer: a Existência Humana transcende o humano e abarca dimensões não racionais, não políticas, não sociais e, em certo sentido, incompreensíveis. Portanto, dimensões invariavelmente dogmáticas, para desespero de alguns de nós.

Foi mais ou menos isso que eu quis dizer no solo de Blues que eu fiz no nosso último show de rua, mas talvez a idéia tenha ficado meio truncada naquela escala. Rsrs ...

Abração
joao

Lisa disse...

João! Sem dúvida o Existencialismo como arte merece mais definição do que o exposto pelo meu post, peço-te desculpas pelas omissões que, na internet, devem ser calculadas de acordo com a paciência de um possível leitor.

Minha intenção de expor o ventre que deu à luz ao pensamento existencialista, não encontrou outro alicerce que não a maneira humana de explicar sua própria existência no existir ou não de um deus.

Por trás de cada uma das escolhas tomadas por um indivíduo há a influência de suas crenças em relação à existência humana e o sentido da vida.

Enfrentrar a existência de uma forma ativa ou inerte, realizadora ou desistente, ocidental ou oriental, engajada ou individual, nada mais é do que a tentativa de seres racionais de encontrar uma razão que justifique ou não viver.

É no que os homens acreditam que eles se distinguem e não no que fazem ou deixam de fazer. Pois dois homens podem ter a mesma atitude ante sua própria existência, por razões completamente diferentes.

Sim, a existência trascende o fator humano. O fator humano é tudo o que conseguimos criar à partir da nossa imaginação e experiência. Do nosso existir. Dos quais o post "Transformação artística" e o seu solo de blues são exemplos. Mas e o resto? Tudo aquilo que não é criação nossa? Que olhar lançaremos para o desconhecido?

Não é à toa que todos os movimentos artísticos são caracterizados, dentre outras coisas, pela sua relação com o universo.

O Existencialismo, antes uma crise humanista de homens divididos entre teocentrismo e antropocentrismo, ganha força hoje nas bases imparciais e contemporâneas do biocentrismo.

É ele que escolta os pensamentos dos órfãos das concepções anteriores. Mesmo daqueles que ainda não se deram conta que ficaram órfãos...

Talvez essa mudança de concepção aconteça. Talvez não. Talvez o Existencialismo seja uma transição. Talvez se arraste ainda por muitos anos e se torne um movimento lento em tempos de mudanças rápidas. De qualquer forma, me parece que por trás de sua angustiante sobrevida (assim o sinto), os existencialistas estão a tentar um cessar fogo em meio aos extremismos crescentes.

Um grande abraço, Lisa

JP Charleaux disse...

Entrei pra dar corda no debate, mas vi que tem uma foto nova no seu perfil. Acabei esquecendo o que eu ia dizer.
joao