sexta-feira, março 20, 2009

29 anos contando estrelas

Mas que gênio foi esse que expulsou de mim aquela encantadora ilusão, na qual eu imaginava ver, no horizonte, o azul do céu emendando-se com o azul do mar?

Tão logo se explica um fenômeno e já ele perde o encanto. Nossos olhos, então, substituem a magia pela explicação.

É preciso uma boa memória sentimental para conservar a beleza de um mundo esclarecido.

Dizem, que o sentimento não deve dispensar o juízo, e eu penso que a razão, igualmente, não está autorizada à dispensar os sentidos. Assim, um sem o outro, os extremos são horrivelmente insatisfatórios.

Ora, não é, o próprio contentamento, um gostinho de infância em lábios sensatos? Que alegria é completa se sofrer de constrangimento, censura ou culpa?

Talvez, em um texto poético, me seja permitido dizer que a sensibilidade aos detalhes é o que nos faz olhar para céu e divisar constelações. Repetindo, ainda, o aviso daquele engenhoso físico: a imaginação é indispensável.

Julgo que desse prazer de minúcias é que desenvolver-se-á o prazer intensificado. O desfrutar aguçado, capaz de perceber muito mais do que os olhos registram.

E não é, precisamente isso, a consciência das sensações? Exatamente isso o que nos faz habilita à apreciar algo da melhor maneira possível?

O que, sem dúvida, é uma prática bem mais satisfatória do que a pluralização superficial dos prazeres.

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Alguns anos atrás, contemplando a bela estrela D’alva surgir desacompanhada num horizonte ainda iluminado pelo fim da tarde, após me deleitar durante horas nesse prazer individual que nos proporcionam os livros, entendi, definitivamente, que aquilo que sentimos não pode ser plenamente compartilhado. A solidão seria, afinal, parte do que somos.

Mais tarde, pelo breve período em que morei sob o céu estrelado de Punta Del Leste, no Uruguai, dediquei-me à longas caminhadas pela orla quase insular da cidade, me entregando pacificamente à sensação de isolamento sugerida por sua geografia. Só, então, consegui respeitar e gostar dessa solidão que nos habita.

Mas aconteceu que me persuadi, num certo entardecer de ventos cálidos, nesta mesma data, a subir no encrespado das rochas portuárias para infiltrar-me no recanto dos leões marinhos, e acabei por esquecer das horas naquela paciente espera com a qual observamos o comportamento da natureza. À minha frente, a divergência de tonalidades das águas do Mar Del Plata e do Atlântico se perderam no crepúsculo. E dispus-me, sem sucesso, a procurar o cruzeiro do sul no firmamento.

Esse pequeno espaço de noite, acabou se transformando na recordação de maior nitidez emocional que possuo. Foi lá, em águas estrangeiras, destituída da habitual navegação astronômica, que compreendi, pela primeira vez, que escrever era um modo de comunicação sem obstáculos. Que mesmo sem diminuir-lhe o peso, a solidão podia ser compartilhada. Pois a solidão daquele que escreve, pode se comunicar com a solidão daquele que o lê. Desde então, enfrento o mundo como uma náufraga, que joga insistentemente garrafas com mensagens ao mar.

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Gosto de olhar para o céu, e refletir distraidamente. De escrever com intenções no coração ou por simples fingimento. Gosto de ser surpreendida por uma estrela-cadente. E de relembrar uma das maiores lições que já aprendi:

Só há resposta se houver estímulo.

quinta-feira, março 12, 2009

EPÍGRAFE PARA MEU ESPELHO

Só se pode tomar posse do presente, todas as outras garantias são, na verdade, abstratas.