sexta-feira, dezembro 07, 2007

transformação artístitica

Despojado das horas não consagradas ao seu subnutrido intelecto, no fim de um dia consumido pelo aproveitamento, o sujeito recostou corpo e culpa nas fazendas que revestiam seu leito.

Ali, sobre a textura passiva dos tecidos artificiais, contemplando os volumes literários adormecidos na estante, reuniu os personagens que lhe representavam no dia-à-dia tal como, fora de cena, o diretor teatral solicitaria a presença de seu grupo de farsistas.

Condenou-se por enfrentar a vida à maneira que o ator afronta o tablado. Absolveu-se por não querer ser assim.

Havia muitas máscaras para subtrair. Protagonistas de comédias ou coadjuvantes de tragédias, eram todas suas. Eram ele nos mais variados arquétipos extraídos de sua singularidade. Adaptações moldadas pelo cenário e por toda a sorte de gente que adornavam os espetáculos verídicos em que ele contracenava.

Dissolveu-as. Dissociou as ações dos anseios para, constitutivamente, encaixar as peças que personificariam novamente a criatura que imaginava ser.

Explorou-a. Pacificou-lhe as contradições. Aliviou os pesos que carregava mutilando as importâncias que outrora havia aceitado sem contestar.

E, como à uma paisagem estéril, confrontou-se.

Não havia elevação ou subordinação para com nada. Consentia em sentir-se medíocre.

A vida se mostrou para ele como um suícidio lento, no qual preconceitos e prazeres eram subsídios que sustentava para apegar-se à ela por mais tempo.

Não discordou. Retribuiu-lhe com o sorriso de quem já sepultara alguns vínculos.

Desmistificada, ela lhe devolveu o gesto com a consciência do tempo que passa.

Assustado, sentiu-se agitar pela insignificância de pensar que existia, apenas.

Deitou a pena nos papéis e escreveu. Escreveu e quedou-se. Propagou-se. Perpetuou-se.

Cada despertar (con)textual que sucedeu àquele, tencionava dilatar a efetividade do seu ser. Mas, então, como uma idéia insensata a torna-se fatídica, retornava aos palcos da sua rotina.

Porém, recusava agora atuar de vítima. E, um dia, rejeitaria de todo a obrigação de representar. Haveria de continuar improvisando, mas seria, daquele momento para sempre, o escritor da história.