sexta-feira, outubro 13, 2006

Rebanho do absurdo

Empregou-se o epíteto "absurdo" à dramatologia que, advinda do existêncialismo, usou recursos romanescos para ampliar o vazio instalado no íntimo do ser socializado.
O teatro do absurdo serve-se das frívolidades cotidianas para ilustrar o contra-senso em que nos encontramos mergulhados. Como estilo não pretende, explora. E, consoante a tudo que há de contraditório, tem por efeito atrair meus sentidos.
Meu primeiro contato com este gênero foi um encontro precoce, de minha consciência intelectual, com a obra de Qorpo Santo. Aconteceu na biblioteca escolar, quando encontrei um exemplar de "Relações Naturais" extraviado na estante do "Surreal".

Inventando estória!? Veja, desde quando aprendi a fazer uso da narrativa que não traço uma sem lhe meter algumas carochas, mas chamo a atenção para o fato de que não o faço desintencionalmente. Prossigamos!

Mais tarde, tive a oportunidade de ver encenada aquela e outras peças em palcos improvisados na capital gaúcha. Desde então, tenho experimentado o contexto aparentemente ilógico deste universo teatral tão pouco descortinado.
Há poucos meses atrás, aqui em Brasília mesmo, por uma feliz fatalidade que só a ignorância faz por você, caí inadvertidamente na platéia de uma montagem de O Rinocente, de Ionesco. Esse, considerado por muitos o pai da linguagem cênica de que venho discorrendo.
Mas se você, principiante, tomar por dita a indicação latente, e resolver se aventurar nas artes do absurdo, leve consigo discernimento extra para não incorrer no equívoco tolo de confundí-la com a arte burlesca. O absurdo é um animado esboço da sombria natureza humana.

Pois o que é mais triste que um grande rebanho de ovelhas merinas!? - Qorpo Santo

O RINOCERONTE.
Espetáculo adaptado do texto de Eugéne Ionesco.
Direção: Hugo Rodas.

quinta-feira, outubro 05, 2006

Metamorfose nossa de cada dia

Aqui jaz um ser que andava em busca de limites que o cercassem de aparente segurança;
Aqui jaz uma mente outrora formadora de definições que obedeciam seu conforto;
Aqui jaz, em silêncio eterno, aquela que adotava referenciais para sustentar transitórias convicções.
Aquela que, em nome da sistemática pedagogia, foi instigada a separar para melhor proveito das ciências, o certo do errado e o preto do branco, mas pouco foi advertida a perceber a sutileza que diferencia circunstancialmente os opostos.
Pereceu contemplando o mágico encadeamento universal de todas as coisas, que faz idéias adversas se tocarem antagonica e complementariamente.
Ao experimentar uma deliciosa emoção que só de terras inseguras pode germinar, dispôs do seu último suspiro idealista para cumprir seu dever de morrer.

Falo para mim mesma quando digo:
Que descanse em paz!

E assim, vai ficando cada vez menor e distante o indivíduo para aqueles que o observam do chão.


"É chamado espírito livre aquele que pensa de modo diverso do que se esperaria com base em sua procedência, seu meio, sua posição e função, ou com base nas opiniões que predominam em seu tempo. Ele é a exceção, os espíritos cativos são a regra."
NIETZSCHE - Humano, demasiado humano.